25 abril, 2008

Palavras

há palavras a mais neste mundo,
disse o sábio
por isso não temas o silêncio
e assim permanece
perante a montanha,
perante o templo,
perante as mulheres,
perante a água
(são a mesma e única coisa
o templo, a montanha, as mulheres e a água)

observa o mistério do silêncio
só ele te dará a palavra
certa, adequada, criadora.

A Louca


Diz ela "que lingua porca, mete-te na tua vida, ainda levas hoje", para a outra que do lado de lá esbraceja, rodopia, dá saltos para a frente e para trás, agarra numa vassoura que usa como uma arma, esconde-se em casa, atira-se para o chão em birra de criança e diz, diz, diz
...............diz o que os anos lhe espetam na cabeça, o que a cabeça inventa no mapa dum corpo corroído pela doença, pela indiferença, pela solidão, pela destruição, pelo desalinho, numa incomunicabilidade entre uma parte de si e a outra, numa contínua fragmentação vinda sabe-se lá de onde;
...............os olhos para lá das mãos, as mãos para lá da boca, as pernas que a levam para lá do lado de lá, de cá, do cima e do baixo, do dentro e do fora, para lá de tudo, mas sempre para dentro, tão dentro que deixa de se reconhecer, e vive apenas nos gestos e palavras de inocente provocação.

E com a sua "língua porca", a única que o corpo lhe permite e pede, vai lançando sexo pelas ruas, em imagens surreais, oníricas, "porcas".
Mas "porcos" seremos nós que ouvimos a louca e nos ofendemos com a sua "língua": ofendemo-nos, ou reconhecemos as nossas fantasias nas suas palavras?

01 abril, 2008

Na Roda

entra na roda, não temas
vem e dança toda a dança
é a dança da vida
não temas
vem para a roda da vida, a roda do fogo, a roda da roda
não temas
a tontura
a vertigem da roda e da dança
tantas mãos, tanto suor, tanto corpo
na roda, não temas
dá-te à roda, dá-te à dança
entra no ritmo
entra na roda
da vida
não temas

Aceita.

"um dia também tu serás alimento"
disse o mestre a quem o ouvia.