
Diz ela "que lingua porca, mete-te na tua vida, ainda levas hoje", para a outra que do lado de lá esbraceja, rodopia, dá saltos para a frente e para trás, agarra numa vassoura que usa como uma arma, esconde-se em casa, atira-se para o chão em birra de criança e diz, diz, diz
...............diz o que os anos lhe espetam na cabeça, o que a cabeça inventa no mapa dum corpo corroído pela doença, pela indiferença, pela solidão, pela destruição, pelo desalinho, numa incomunicabilidade entre uma parte de si e a outra, numa contínua fragmentação vinda sabe-se lá de onde;
...............os olhos para lá das mãos, as mãos para lá da boca, as pernas que a levam para lá do lado de lá, de cá, do cima e do baixo, do dentro e do fora, para lá de tudo, mas sempre para dentro, tão dentro que deixa de se reconhecer, e vive apenas nos gestos e palavras de inocente provocação.
E com a sua "língua porca", a única que o corpo lhe permite e pede, vai lançando sexo pelas ruas, em imagens surreais, oníricas, "porcas".
Mas "porcos" seremos nós que ouvimos a louca e nos ofendemos com a sua "língua": ofendemo-nos, ou reconhecemos as nossas fantasias nas suas palavras?